Descrição
“Portanto, a brutalização do sistema penal recai efetivamente sobre as parcelas da população que não lograram internalizar o habitus primário (domínio da razão sobre as emoções, cálculo prospectivo, autorresponsabilidade), já que, a partir de consensos opacos e pré-reflexivos, deixa-se entrever que esses atores sociais não são dotados do mesmo reconhecimento social. Se a dignidade pressupõe um reconhecimento universal entre iguais, é óbvio que um sistema penal que criminaliza massivamente sempre a mesma extração social está condicionado por estes consensos morais opacos.” A criminologia parece nitidamente manter uma relação de profunda ambiguidade com a noção moderna de dignidade humana. Seja pelo desvendamento de que o pensamento clássico escondia, na verdade, sob seus componentes epistemológicos, uma retórica de justificação da sociedade disciplinar e da prisão como fábrica da delinquência, seja pela sua negação aberta e radical promovida pelos discursos dos determinismos biopsicológico e social do positivismo criminológico. Diante da trama complexa entre as reais funções dos sistemas punitivos e seus discursos de justificação, Criminologia, (in)visibilidade, reconhecimento O controle penal da subcidadania no Brasil tem com principal objetivo reconstruir a genealogia do controle penal da sociedade atual, nas suas contraditórias relações com a noção moderna de dignidade humana. O autor problematiza uma gradativa constituição das representações simbólicas punitivas no interior da dinâmica dos conflitos políticos e sociais, a fim de identificar as funções tanto declaradas, quanto latentes dos discursos punitivos e suas práticas concretas. Bem como procura compreender o universo do imaginário punitivo da modernidade à luz das relações e tensões intrínsecas existentes entre as formas de legitimação da ordem instituída e as aspirações emancipatórias ou forças instituintes. A partir desse quadro interpretativo, o autor apresenta os seguintes questionamentos: por quais razões e de que maneira a criminologia, enquanto ciência que emerge na modernidade capitalista, dá prioridade a discursos e práticas punitivas destinadas a garantir a ordem social instituída que têm por objetivo político banir o conflito e as forças instituintes e, por conseguinte, eliminar a própria ideia moderna de dignidade humana? Em seguida, apresenta a recepção e a influência dos discursos criminológicos no capitalismo periférico, percebendo assim, em que medida a negação da dignidade humana assume um caráter ainda mais perverso e dramático de legitimação de um genocídio continuado. O livro desvela como o sistema penal das sociedades do capitalismo periférico, em particular do Brasil ao constituir-se a partir da negação radical da noção moderna de dignidade humana atua como um dos mais importantes mecanismos de naturalização da desigualdade e gestão da subcidadania. E como, por conseguinte, esse mesmo sistema penal reproduz sistematicamente, no âmbito de suas práticas e instituições, os fenômenos políticos da invisibilidade pública e da humilhação social. O fio condutor do livro consiste em perceber as contradições internas existentes no projeto sociocultural da modernidade, em especial no âmbito de suas representações simbólicas punitivas, e desvelar a dramaticidade que essas contradições assumem nas sociedades do capitalismo periférico, em particular no Brasil. Criminologia, (in)visibilidade, reconhecimento O controle penal da subcidadania no Brasil descortina as razões pelas quais o sistema de justiça penal brasileiro atua como o mais importante e fundamental mecanismo de demarcação das fronteiras e das hierarquias sociais e de gestão da subcidadania, assumindo, facilmente, o extermínio físico e o encarceramento em massa destituído de respeito à legalidade (campo de concentração) como estratégias primordiais de controle social. O sistema punitivo brasileiro aparece, portanto, como um monumental campo político e burocrático de gestão da miséria e da exclusão política, ao não permitir o fechamento e a cicatrização de uma chaga social consubstanciada no fenômeno essencialmente político da invisibilidade pública, expressão que resume diversas manifestações de um sofrimento político: a humilhação social.
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